Ciclo de Cinema Silencioso do Cineclube Latino-Americano – sessão de filmes da Revolução Mexicana

Semana passada eu postei meu relato sobre a oficina Música para Cinema Mudo, ministrada pelo pianista mexicano José María Serralde Ruiz, organizada pelo Cineclube Latino-Americano. A oficina foi parte da programação do Ciclo de Cinema Silencioso, que aconteceu no contexto do 9º Festival de Cinema Latino-Americano de São Paulo. Em um outro post, no qual falei sobre a programação completa do Ciclo, chamei a atenção para a sessão do dia 26 de julho, quando seriam exibidos filmes da revolução mexicana.

É sobre essa sessão que vou falar um pouquinho hoje:

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O professor Aurelio de los Reyes apresentando a sessão

Vou começar dizendo que foi extremamente emocionante poder rever alguns dos filmes mexicanos que assisti na Giornate del Cinema Muto no ano passado e ouvir novamente o belíssimo acompanhamento de José María no piano. Mas o mais importante dessa sessão no Cineclube foi a presença do pesquisador Aurelio de los Reyes! Quando estive em Pordenone, em outubro passado, fiquei muito chateada ao perceber que a trupe mexicana (pesquisadores, restauradores, músico etc.) não recebeu a devida atenção e respeito. Era essencial que os filmes exibidos lá tivessem algum tipo de explicação… Mas Aurelio não foi convidado a apresentar nem comentar nenhuma sessão e tampouco participou dos debates do Collegium.

No Cineclube Latino-Americano foi diferente: Aurelio apresentou a sessão e comentou todos os filmes, enquanto eram exibidos, explicando o que víamos e chamando a atenção para diversos aspectos interessantes… Na Itália foram exibidos 3 programas ao todo; aqui em São Paulo assistimos ao terceiro, imagens de 1913 a 1923 mostrando principalmente os exércitos de Francisco Villa e Emiliano Zapata. Antes da sessão começar, o professor Aurelio falou um pouco sobre a tendência “documental” das origens do cinema mexicano. Segundo ele, isso se explica principalmente por três motivos: a dependência tecnológica; a falta de grandes capitais (o cinema era uma atividade “familiar” e não havia dinheiro para a criação de estúdios); e o culto à ciência com a introdução do positivismo no século XIX. Mais sobre esse assunto neste post.

Foi possível perceber essa tendência nos filmes a que assistimos… Muitas vezes são longos e repetitivos justamente porque tinham o objetivo de mostrar os acontecimentos “por completo”.

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Catálogo do Festival, programação e ingresso da sessão

Uma curiosidade interessante que o professor mexicano nos contou foi que, no exército de Zapata, havia uma tropa composta por mulheres que se vestiam como homens. Em um filme de desfile de tropas, ele apontou o momento em que ele acredita que elas estejam desfilando. Ele conseguiu distingui-las por seu passo mais curto!

Outro aspecto que me interessou foi o que Aurelio chamou algumas vezes de “atração”. Ele apontava sempre que os filmes mostravam os homens comuns, nas ruas, observando os desfiles militares, tentando ver as câmeras e, principalmente, tentando ser vistos por elas. Ele disse que era muito comum, na época, o público ir ao cinema com o objetivo de se ver na tela. Gostei muito de ouvir isso porque esse foi, justamente, o tema do meu Collegium Paper (o texto que todo selecionado para o Collegium da Giornate del Cinema Muto deve escrever depois do festival). Quando eu assisti aos filmes mexicanos em Pordenone me chamou muito a atenção as imagens desses homens comuns que tentam ser vistos. Muitas vezes vemos eles serem retirados de campo à força, por guardas, por exemplo (isso não acontece nos filmes que vimos no Cineclube; acontece nos filmes mais antigos, durante a ditadura de Porfirio Díaz). Quem sabe um dia eu posto esse texto aqui no blog.

Foi como nos primeiros tempos do cinema: o pianista de um lado, o comentador de outro. E, nesse caso, a oportunidade única de ouvir a um pianista maravilhoso e a um comentador que é o principal pesquisador de cinema silencioso do México… Uma sessão simplesmente inesquecível!

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NA MOSCA! #2 – cinema mudo latino-americano

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A dica dessa semana é a programação do Ciclo de Cinema Silencioso organizado pelo Cineclube Latino-Americano que vai rolar no contexto do 9º Festival de Cinema Latino-Americano de São Paulo, no Memorial da América Latina. O Festival começa nesta quinta (24/julho/2014) e vai até a próxima quarta (30/julho/2014).

Festival Latino

A programação do Ciclo, organizada pelo Cineclube sobre o qual já falei aqui, está maravilhosa e simplesmente imperdível. Todos os filmes terão acompanhamento musical feito ao vivo [*] e a mostra ainda conta com duas oficinas, uma sobre música para Cinema Mudo, com o pianista mexicano José María Serralde Ruiz, e outra sobre como criar um Cineclube, com um cineclubista que é referência para o movimento, Frank Ferreira. Aí vai a programação e depois o meu destaque:

24/julho, quinta
16h Oficina “Música para Cinema Mudo” com José María Serralde Ruiz
20h “El Húsar de la Muerte” (Pedro Sienna, Chile, 1925, 60′), acompanhamento musical de Allen Alencar, Daniel Brita, Ivan Gomes e Pablo Mendoza

25/julho, sexta
16h Oficina “Música para Cinema Mudo” com José María Serralde Ruiz
20h “La Virgen de la Caridad” (Ramón Peón, Cuba, 1930, 72′), acompanhamento musical de Jorge Peña

26/julho, sábado
10h Oficina “Música para Cinema Mudo” com José María Serralde Ruiz
16h Conclusão da oficina “Música para Cinema Mudo”
19h “Da ditadura de Huerta à rendição de Pancho Villa” com apresentação de Aurélio de los Reyes e acompanhamento musical de José María Serralde Ruiz <- esse é o meu destaque, veja abaixo!
21h “Yo perdí mi corazón en Lima” (Alberto Santana, Peru, 1933, 47′), acompanhamento musical da Banda Araticum

27/julho, domingo
18h Lançamento do livro “A Música no Cinema Silencioso no Brasil” de Carlos Eduardo Pereira, com a presença do autor
20h “El Automóvel Gris” (Enrique Rosas, México, 1919, 117′)

28/julho, segunda
16h Oficina “Criar um Cineclube” com Frank Ferreira
20h “La Borrachera del Tango” (Edmo Cominetti, Argentina, 1928, 80′), acompanhamento musical de Tadeu Romano e Pablo Mendoza

29/julho, terça
16h Oficina “Criar um Cineclube” com Frank Ferreira
20h “Lábios Sem Beijos” (Humberto Mauro, Brasil, 1930, 72′), acompanhamento musical de Joel Lourenço, e “Fragmentos da Vida” (José Medina, Brasil, 1929, 40′), acompanhamento musical de Carlos Eduardo Pereira

30/julho, quarta
16h Oficina “Criar um Cineclube” com Frank Ferreira
20h “Bajo el cielo Antioqueño” (Arturo Acevedo Vallarino, Colômbia, 1925, 98′), acompanhamento musical de Pablo Mendoza

[*] Com exceção de “O automóvel Cinza”, uma versão dublada feita em 1933 pelo diretor.

Toda a programação vale a pena, mas vou enfatizar a importância da exibição do dia 26, sábado, às 19h. Já falei bastante aqui no blog sobre o pesquisador mexicano Aurelio de los Reyes. Ele foi o responsável pela curadoria da programação mexicana que vimos na Giornate del Cinema Muto de Pordenone, em outubro do ano passado. Foram três programas diferentes: desde curtas feitos pelos enviados dos Lumière em 1896, passando por filmes da época de Madero (começo dos anos 1910) e chegando até as imagens da revolução armada de Zapata e Villa (com filmes de 1913-1923).

Tê-lo aqui no Brasil apresentando uma sessão é uma oportunidade única!

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Aurelio de los Reyes com o Prêmio Jean Mitry em Pordenone (outubro/2013)

As sessões mexicanas de Pordenone foram maravilhosas, não só pela possibilidade de ver essas imagens recém encontradas, mas também pelo precioso acompanhamento musical de José María Serralde Ruiz, um pianista apaixonado e muito competente. Foi uma das pessoas mais especiais que eu conheci no Festival. Ele levou um tipo de música que a Europa não está acostumada a ouvir… Música mexicana tradicional que era ouvida na época dos filmes…

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Eu e José em Pordenone em algum intervalo entre sessões! (outubro/2013)

A sessão com filmes da revolução mexicana apresentados por Aurélio de los Reyes e música ao vivo de José María Serralde Ruiz é, para mim, o destaque desse Ciclo.

Dia 26, sábado, às 19h, no Cineclube Latino-Americano!
Memorial da América Latina – Av. Auro Soares de Moura Andrade, 664 –  Barra Funda, São Paulo – Página do Cineclube no Facebook

[A inscrição para a oficina de José María Serralde Ruiz deve ser feita pelo e-mail pablomendoza83@gmail.com e a inscrição para a oficina de Frank Ferreira é pelo site do Festival.]

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diário da Giornate – cine y verdad

Diário da Giornate

Enquanto esperamos a divulgação oficial da Giornate del Cinema Muto sobre os filmes mexicanos que serão exibidos esse ano, vou falar mais um pouquinho sobre os primeiros tempos do cinema no México.

Segundo Aurelio de los Reyes, o mais importante pesquisador do cinema mexicano silencioso e curador da parte mexicana da programação da Giornate, o Cinematógrafo foi muito associado à ideia de verdade. Principalmente na virada do século, quando o cinema estava começando a se espalhar pelo país, os jornalistas locais se referiam muito à capacidade do cinema de ser uma espécie de olho justo e preciso a que nada escapava e que registrava a realidade.

O cinema, portanto, foi comumente visto como uma forma de registrar a história, sem alterações, sem a manipulação de interesses conflitantes. Os intelectuais da época comentaram essa crença com frequência, tanto em relação aos “grandes feitos de homens importantes” como aos “pequenos feitos da vida cotidiana“.

No periódico “La Semana” de 20 de março de 1898, o jornalista Amado Nervo nos dá um exemplo:

Este espetáculo sugere o que será a história no futuro; não haverá mais livros; o fonógrafo guardará em sua caixa preta as velhas vozes extintas; o cinematógrafo reproduzirá as vidas de prestígio… Nossos netos verão os nossos generais, os intelectuais, os nossos mártires e nossas resplandecentes mulheres com suas cabeleiras douradas… Oh, se nós tivéssemos podido reconstruir assim todas as épocas, se graças a um aparato pudéssemos ver o imenso desfile dos séculos… Como de uma estrela, assistir à marcha formidável dos mortais através dos tempos…

Outro exemplo interessante podemos ver nesse trecho escrito por José Juan Tablada, no jornal “El Universal”, de 12 de dezembro de 1896:

Sonho realizável para um herói que, em vez de ter um álbum de fotos onde as imagens empalidecem como os cadáveres nos caixões, teria um cinematógrafo e, quando quisesse viajar pelo passado e submergir na profunda vida das recordações, poderia contemplar o andar pausado da mãe já desaparecida, os movimentos gentis da namorada morta enquanto o fonógrafo derramaria em seu ouvido o belo tom das frases maternais e o ritmo apaixonado dos juramentos de amor!

Essa capacidade de “reproduzir a verdade” parece ter sido de fato a mais explorada pelo cinema mexicano dos primeiros tempos. Até 1900 apenas um filme encenado foi feito, “Duelo a pistola”, a reconstituição de um duelo entre dois deputados, um dos quais foi morto da briga. Esse filme recebeu muitos comentários negativos dos jornalistas por ser um “desrespeito”, principalmente com quem assistisse sem saber se era o registro verdadeiro ou uma encenação.

Não posso dizer com certeza, mas me parece que o filme é esse aqui:

Todos os outros filmes feitos nessa época, pelo que parece, foram registros de solenidades públicas, viagens do general Porfírio Díaz etc., o que indica que realizadores e imprensa estavam unidos na exploração do cinematógrafo como instrumento de documentação histórica. Principalmente aquela história dos “grandes feitos” dos homens do poder.

(Retirei as informações para escrever esse post no livro “Los orígenes del cine en México (1896-1900)” de Aurelio de los Reyes, páginas 104-114.)

diário da Giornate – uma crônica cinematográfica de 1897

Diário da Giornate

Pesquisando sobre o cinema silencioso mexicano, já que alguns filmes sobre a revolução mexicana serão exibidos na Giornate del Cinema Muto desse ano, achei o livro “Los orígenes del cine en México (1896-1900)” de Aurelio de los Reyes. Que sorte encontrar esse livro na biblioteca da minha faculdade! É uma das primeiras obra de De los Reyes que, como eu já comentei, é o principal estudioso sobre o período mudo do cinema do México. A principal fonte de pesquisa do livro são os jornais da época, já que a grande maioria dos filmes se perderam e, no tempo em que ele escreveu (1972), o acesso aos filmes sobreviventes era ainda mais difícil que hoje.

Minha ilustração favorita do livro de Aurelio de los Reyes!

Minha ilustração favorita do livro de Aurelio de los Reyes!

No final do livro há um apêndice com documentos da época, trechos de notícias e reportagens relacionadas ao cinema dos primeiros tempos no México. Um texto que me chamou a atenção foi uma “crônica cinematográfica” publicada no jornal El Mundo (Ilustrado) em 28 de novembro de 1897.

É como uma vista da cidade, com especial atenção para seu movimento.

Reproduzo aqui uma tradução minha da crônica:

Cansado de rever os jornais, ávido pelas notícias, e de encontrar neles versos e contos de meus amigos distantes, abandono meu assento e me acotovelo na sacada de meu quarto de trabalho. Não estou com vontade de conversar com meus amigos no clube, sobre casas ligeiras e alegres, mulheres mundanas ou cavalos de corrida, sua eterna conversa, e me entrego a observar a rua, iluminada debilmente pela luz melancólica do gás. São nove da noite.
E aí, na varanda, cotovelos no parapeito, vão desfilando diante de meus olhos indiferentes e ociosos:
Primeiro um mocinho elegante que caminha apressado – talvez para um encontro de amor -, e que ao andar vai se olhando em sua sombra. Atrás dele, a alguns passos, duas lindas senhoritas passeiam, de braços dados, com as adoráveis cabecinhas cobertas e aprisionando suas finíssimas silhuetas em primorosos jerseys. Falam com entusiasmo e de vez em quando suas risadas cristalinas, frescas e mal contidas, chegam a meus ouvidos. Um jovem com o chapéu na mão se aproxima para falar com elas, mas um carro que nesse momento atravessa a rua me impede de ouvir suas palavras. Pela portinhola, alguém que não conheço acena com a mão e grita para mim – “Adeus, Marius” – saudação a que não respondo porque, quando quero fazê-lo, o carro já está longe. Depois, alguns ladrõezinhos passam correndo e com tal velocidade que não vêem em um enorme cachorro de Terranova, que dorme ao longo da vereda, e caem em cima do inofensivo animal; afastam-se às gargalhadas.
Uns passinhos ligeiros e miúdos ao lado de outros mais firmes e sossegados me fazem pulsar o coração com violência e virar rapidamente a cabeça. É ela, minha amada, clara e elegante, que passa esquiva, orgulhosa, falando com sua mãe e que não olharia por nada para minha varanda porque de longe já havia me avistado.
E eu, de cotovelos no parapeito, a mão direita escondida em meu desordenado penteado, enquanto a esquerda me oprime nervosamente a palavra, fico observando até perde-la de vista…
Da sacada entreaberta da casa vizinha escapam muitas notas vibrantes de uma valsa caprichosa e aristocrática – a mesma que dançava com ela quando declarei meu amor -, e uma revoada de pássaros brancos, as Lembranças, vêm cantarolar em minha alma, onde uma semínima, a Tristeza, agita desesperadamente as ondas…

É interessante notar a convivência entre elementos modernos (como carros, velocidade, pressa e o próprio ato de observar a cidade através de uma janela) e elementos que mostram o lado arcaico da cidade mexicana da época (luz a gás, o amor romântico). Isso parece apontar para a coexistência dos aspectos pré-modernos e modernos que sabemos existir na história dos países periféricos. Elementos que se sucederam nos países centrais, conviveram em simultaneidade por nossas bandas. 

Parece que essa crônica fazia parte de uma série, como uma coluna publicada com uma certa periodicidade. No livro “Los orígenes del cine en México (1896-1900)” o texto está assinado por José M. Barreto, mas parece que na época as crônicas eram assinadas por Lumière e intituladas de Cinematógrafo, o que estreita ainda mais a relação com o cinema.

diário da Giornate – tateando o cinema silencioso mexicano…

Diário da GiornateVoltando à série de posts sobre a programação da Giornate del Cinema Muto desse ano: cinema silencioso mexicano!

Uma das atrações da Giornate de 2013 será a primeira parte do “The Mexico Project“, com curadoria do historiador de cinema mexicano Aurelio de los Reyes. Os filmes ainda não foram anunciados, mas pelo que foi divulgado até agora, sabemos que serão documentos relativos à revolução mexicana com heróis da luta armada como Emiliano Zapata e Francisco (Pancho) Villa.

Pesquisar o cinema silencioso de cinematografias periféricas como a mexicana (e também a brasileira!) é uma aventura. Pouquíssimos filmes sobreviveram e menos ainda estão disponíveis online. São poucas as fontes escritas – e muitas vezes encontramos informações que se contradizem, o que atrapalha muito a tentativa de compreender o período. Estou, como coloquei no título do post, realmente tateando esse assunto pelas bordas… Se o próprio cinema mexicano canônico e contemporâneo é pouco conhecido aqui no Brasil, imaginem o cinema silencioso!

Sobre o começo do cinema: descobri que, como em outros países do mundo, foram enviados pelos Lumière dois cinematografistas, que chegaram ao México em julho 1896. No dia 5 de agosto, eles fizeram uma primeira apresentação do Cinematógrafo para o General Porfírio Díaz, sua família e alguns amigos próximos. Eles gostaram tanto dos filmes que passaram quase a noite inteira assistindo várias vezes! Em 14 de agosto de 1896 foi feita a primeira projeção pública, pelos mesmos enviados franceses, sem acompanhamento musical. Intelectuais da época comentaram sobre o realismo do movimento das imagens e sentiram falta das cores, como no clássico relato de Máximo Gorki. Alguns acreditaram que o cinema, no futuro, substituiria os livros. Logo depois, muitas cenas da vida pública mexicana foram filmadas pelos enviados dos Lumière, como festas populares e eventos políticos.

A sociedade mexicana da época ainda era predominantemente agrária. E a elite, que viu no cinema um aparato científico de modernização, fez de tudo para aumentar o preço dos ingressos para que a gente pobre não tivesse acesso à novidade.

As primeiras salas de cinema apareceram no centro comercial da Cidade do México, mas logo se espalharam pelas regiões mais pobres. E, no começo do século, ambulantes levaram o cinema para o campo. Mostravam filmes de Méliès, Porter e outros.

Encontrei também algumas outras coisas legais. Aí vão:

* “La vida en México: 18 Lustros” (série de documentários feita com imagens de arquivo sobre a vida no México durante o século XX)

O primeiro episódio da série, “Lustro 1: y cuando el cine llegó, 1900-1904“, dirigido por Aurelio de los Reyes, é uma ótima introdução ao cinema mexicano dos primeiros tempos. Foi deste filme que eu tirei a maior parte das informações deste post. Todos os episódios estão disponíveis aqui nesse link, no site da Filmoteca UNAM, o órgão responsável pelas restaurações que serão exibidas em Pordenone.

* “El automóvil gris” (filme de Enrique Rosas, 1919)

Foi uma série de 12 episódios que contava a história verídica de um bando de ladrões de jóias que atuou na Cidade do México em 1915. O filme foi feito em locações por onde passaram os verdadeiros bandidos e tem até uma cena documental do fuzilamento de alguns deles, feita pelo próprio diretor do filme alguns anos antes.

Dá pra assistir na internet algumas compilações de trechos, com uma sonorização (que inclui uma dublagem super estranha feita nos anos 1950), mas a série completa parece que está em processo de restauração. Esse post do blog Cine Silente Mexicano tem informações bem legais sobre o filme.

* Três filmes silenciosos para assistir online

Também no site da Filmoteca UNAM estão disponíveis três obras do cinema silencioso mexicano de ficção: “Tepeyac” (Carlos E. Gonzáles, José Manuel Ramos e Fernando Sáyago, 1917), uma série que mistura ficção e imagens documentais sobre religião, “El puño de hierro” (Gabriel García Moreno, 1927) um longa dividido em 5 capítulos (que foi inclusive exibido na segunda edição da Jornada Brasileira de Cinema Silencioso aqui em São Paulo, em 2008)…

…e “El tren fantasma” (Gabriel García Moreno, 1926)

Um longa sobre o engenheiro Adolfo Mariel, que vai para Orizaba investigar as irregularidades numa companhia ferroviária. Logo ele se apaixona por Elena, filha de um funcionário da companhia. Mas Paco “El Rubí”, chefe de um bando de bandidos, está comandando diversos crimes na cidade. Em determinado ponto do filme, os bandidos sequestram Elena. São cenas impressionantes. O mocinho, Adolfo, luta com um dos bandidos na parte externa de um trem em movimento! Muito emocionante!

As cenas do salvamento de Elena são as melhores do filme. Adolfo corre à cavalo ao lado do trem onde ela está presa, que está descontrolado! Ele pula do cavalo para o trem, os dois ficam juntos, mas ainda em grande perigo. Depois o trem sai dos trilhos em uma ponte e cai em um rio. É usada uma maquete para esse plano. Mas, claro, os dois se salvam e se casam no final! São também muito bonitos outros planos tomados de trens em movimento e bem interessantes as imagens documentais de uma tourada. O filme tem perseguição, tiroteio, violência, sedução (hahaha)… Vale a pena.

El tren fantasma

Luta entre Adolfo e um dos bandidos em um trem em movimento em “El tren fantasma” (1926)

***

Agradeço ao meu novo amigo mexicano Cesar de la Rosa, também selecionado para o Collegium desse ano, pela generosidade em me ajudar e por todas as dicas sobre o cinema do México! :)

Espero que a divulgação de mais informações sobre os filmes que serão exibidos na Giornate não demore muito!