NA MOSCA! #7 – o filme perdido de Orson Welles agora online

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Uma das sessões mais importantes (e, para mim, mais marcantes) da Giornate del Cinema Muto do ano passado foi a estreia mundial do filme inacabado de Orson Welles, “Too much Johnson” (1938). O filme, que era considerado perdido até então, foi encontrado em 2013 em um depósito de Pordenone, na Itália (a mesma cidade onde acontece a Giornate!).

Too much Johnson” era originalmente um conjunto de 3 curtas que Welles pretendia usar para abrir cada um dos 3 atos de uma peça homônima que ele estava produzindo no Mercury Theater, um teatro em Nova Iorque que ele fundou em 37. A peça era uma farsa de 1894 de William Gillette. O teatro não tinha a estrutura necessária para exibir filmes, então a peça estreou sem os prólogos e os curtas ficaram inacabados, sem nunca terem sido exibidos.

O responsável pela restauração foi Paolo Cherchi Usai, co-fundador da Giornate del Cinema Muto de Pordenone e Curador Sênior na George Eastman House, em Nova Iorque.

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A sessão foi muito interessante porque, como é um filme inacabado e que foi pensado para a projeção durante uma peça de teatro, o próprio Paolo Cherchi Usai acompanhou a projeção com comentários e explicações. Foi uma sessão atípica em Pordenone: o nome de Welles despertou o interesse de muitos moradores da região, que não costumam frequentar o festival. O pesquisador criou, então, uma apresentação para o filme que levava em conta a presença desse público “não-especializado”, como ele mesmo chamou, na sessão do Collegium do dia seguinte, quando respondeu a questões do nosso grupo de jovens estudantes sobre a restauração e a sessão.

Além de explicar a história da peça, detalhes de produção e falar sobre as locações do filme, Cherchi Usai também chamou atenção para o que mais nos interessa, os aspectos formais do filme… Sobre isso, eu escrevi dois posts (sobre as referências que o filme faz ao período mudo e sobre o processo de restauração), que podem ser podem ser visualizados aqui.

A dica dessa semana tem a ver com uma ótima notícia… O filme está, agora, disponível para assistir online! Para ver, é só clicar na imagem abaixo:

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A dica dessa semana foi dedicada àqueles meus amigos que às vezes me perguntam se ainda surgem novidades no mundo do cinema antigo. Pois é, todos os dias novos filmes são redescobertos e esses achados transformam constantemente a história do cinema! :)

Todas as dicas da semana podem ser vistas na série na mosca.

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diário da Giornate – a perseguição em “Too much Johnson”

Diário da Giornate

Como eu disse no post anterior, o filme recém redescoberto de Orson Welles, “Too much Johnson” (1938), será exibido em primeira mão na Giornate del Cinema Muto desse ano, no dia 9 de outubro!

Não sabemos muito sobre o filme, além das informações que já postei… É uma comédia pastelão silenciosa, mas isso não explica muita coisa, né? Vou tentar encontrar mais detalhes enquanto não podemos assistir ao filme de verdade. Na notícia que saiu no New York Times tem uma descrição mais ou menos assim sobre o primeiro curta (são três; cada um abriria um ato da peça, como eu já disse):

O primeiro (e mais completo na cópia redescoberta) era uma perseguição através do baixo Manhattan filmada no estilo de uma comédia silenciosa, com perseguidores do tipo dos Keystone Kops, uma manifestação sufragista para ultrapassar e Cotten [um dos atores] cambaleando à beira de um arranha-céu, como Harold Lloyd em “Safety Last!”

Uau! Temos aí alguns elementos bem característicos das comédias mudas do tipo slapstick! Sobre Harold Lloyd já comentamos bastante por aqui, por exemplo nesse post! Mas podemos olhar mais de perto para essa outra referência, os atrapalhados policiais da Keystone

Cena de "Too much Johnson" de Orson Welles

Cena de “Too much Johnson” de Orson Welles que faz referência aos filmes dos Keystone Kops

Foi no estúdio da Keystone, fundado por Mack Sennett, que surgiram sucessos da comédia pastelão, como os Keystone Kops e ninguém menos que Charlie Chaplin! Os Keystone Kops (ou cops) eram policiais totalmente estabanados, que se envolviam em perseguições cheias de tropeços. Esses bigodudos desgrenhados nos mostram, hoje, como era banalizada a ridicularização das autoridades durante os anos 1910… Eles eram totalmente ineficientes e confusos!

Os Keystone Kops em ação

Os Keystone Kops em ação

Os Keystone Kops surgiram em 1912 (ou 13!) e um dos primeiros (ou o primeiro) filme deles foi “The Bangville Police”. Para começar a se familiarizar com a trupe, aí vai ele:
Uma curiosidade: em 2010, o pesquisador Paul Gierucki comprou um filme em uma feira de antiguidades. A lata dizia “Keystone” e ele pensou ser mais um filme dos famosos Kops. Mas quando assistiu, reconheceu Charlie Chaplin como um dos policiais! Chaplin já havia dito (em sua biografia, por exemplo), que tinha atuado em alguns filmes dos Kops, mas parece que não tínhamos acesso a nenhum! Agora, com o DVD Chaplin at Keystone, é possível assistir a esse filme redescoberto…
Chaplin como um dos Keystone Kops em "The Thief Catcher" (1914)

Chaplin como um dos Keystone Kops em “The Thief Catcher” (1914)

Interessante saber que o filme de Welles não é só um filme sem som sincronizado. Muito mais massa que isso, a obra é um filme mudo no sentido de que sua linguagem remete ao cinema antigo em vários sentidos, inclusive com referências à artistas específicos. Não vejo a hora de poder assistir! :)

PS: Pelas informações sobre o filme em que Chaplin atua como um Keystone Kop, agradeço ao blog Chaplin at Keystone, do meu novo colega Jonny, que estará em Pordenone este ano também como membro do Collegium!

diário da Giornate – “Too much Johnson” redescoberto!

Diário da Giornate

O mundo da preservação audiovisual recebeu na semana passada uma notícia muito especial. Foi encontrado em um depósito de – olha que coincidência – Pordenone, na Itália, um filme de Orson Welles que era considerado perdido. Too much Johnson (1938) era originalmente um conjunto de 3 curtas que Welles pretendia usar para abrir cada um dos 3 atos de uma peça homônima que ele estava produzindo no Mercury Theater, um teatro em Nova Iorque que ele fundou em 37. A peça era uma encenação de uma farsa de 1894 de William Gillette. O teatro não tinha a estrutura necessária para exibir filmes, então a peça estreou sem os prólogos e os curtas ficaram inacabados, sem nunca terem sido exibidos.

Paolo Cherchi Usai, co-fundador da Giornate del Cinema Muto de Pordenone e Curador Sênior na George Eastman House, em Nova Iorque, supervisionou o projeto de restauração do filme. Sobre a descoberta, ele disse:

Essa é de longe a restauração mais importante da George Eastman House em muito tempo. Ter em mãos a mesma cópia que havia sido pessoalmente editada por Orson Welles há 75 anos provoca uma emoção que é simplesmente indescritível.

Pamela Hutchinson, do blog Silent London, entrevistou Usai para o jornal The Guardian, vale a pena ler.

É muito louco pensar que o filme passou tanto tempo esquecido em algum canto de Pordenone, justamente uma das cidades mais importantes do mundo para a preservação do cinema silencioso! Uma cena das filmagens disponível nesse link mostra um pouco do que vem por aí.

Too much Johnson

Esse vídeo, lançado pela George Eastman House, mostra um pouco do processo de restauração do filme, é demais:

Poucos sabem que antes de “Cidadão Kane” (1941) Welles já tinha feito dois filmes. Esse que acabou de ser redescoberto foi o segundo de sua carreira. O primeiro, “The hearts of age” (1934) está disponível online. Aí vai:

Nessa história toda, a notícia que mais me interessa é que a grande estreia de “Too much Johnson” será na Giornate desse ano. Claro, não há melhor lugar para esse evento especial que a cidade do maior festival de cinema silencioso do mundo que, por um mistério ainda não desvendado, foi onde o filme apareceu! A sessão será no dia 9 de outubro e eu estarei lá para presenciar esse momento tão importante! E a ansiedade só aumenta… :)